Qual o papel do escritor brasileiro na atualidade? Perguntaram a Clarice Lispector. O de falar o menos possível, respondeu, como lhe era de praxe, surpreendentemente.
À primeira interpretação, tal resposta pode soar paradoxal, como se o sentido dela fosse o próprio paradoxo – e apenas isso.
Clarice, entretanto, referia-se a algo muito mais profundo: perceber mais, falar menos: a prioridade à percepção em de conclusões. Trata-se de sentir, apalpar, ouvir, enxergar mais e mais profundamente em vez de simplesmente falar à base das primeiras observações, de meros olhares, tal qual a própria costumava fazer ao mergulhar, afogar-se, sofrendo até mesmo o mesmo tiro disparado contra seu personagem.
A experimentação, como busca por estímulos e um exercício da sensibilidade define quão intensa é a percepção humana, acompanhada de toda a aura de admiração que envolve a descoberta. Quando criança, somos estimulados a, diariamente, testar novas texturas, ouvir novos sons, descobrir mistos inimagináveis de cores e uma infinidade de palavras, expressões, idéias, sentidos... Definitivamente, não há fim.
Contudo, quando achamos que já vimos de tudo, realmente fingimos já ter visto de tudo e, ah, a banalidade. Vemos homens e mulheres desesperados pelo que as diferentes formas de prazer, entre as mais egóticas possíveis podem lhes proporcionar como – uma busca atrofiada da hipersensibilidade que um dia já tiveram numa anterior idade viril.
Se assim o é, PJ Harvey resolveu “introceder”. Seu último álbum,
White Chalk surpreende especialmente quem esperava dela ouvir apenas canções de um rock que ainda tenta ser alternativo nos anos 90. Fruto de muitas experimentações, o álbum reúne músicas com o mais agudo e límpido da voz de Polly Jean. Mas o mais surpreendente não é a beleza de sua voz ou a beleza dos sons: a delicadeza de cada mínimo ruído que a variedade de instrumentos usados cedeu às gravações permite que com sentimentos, possamos quase acompanhar as ondas sonoras.
PJ compartilha com seus ouvintes suas experiências musicais e nos permite sentir cada leve toque no piano; sua postura mais comportada é um silêncio para que apenas a música impere. Parece, por vezes, uma criança que quer saber o que é a vida ou uma pessoa qualquer que resolveu olhar para dentro de si, só para ver o que há lá dentro.
Pouco desse processo poderia já ser observado em seu álbum anterior,
Uh huh her, mesmo que de forma mais tímida, como em
The Slow drug e
It’s you.
Como um brinde à sensibilidade, vale a pena conferir
White Chalk.
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